A poesia é aquilo que faz a escrita regressar até o lugar de ilegibilidade de onde provém, aonde ela continua se dirigindo (Giorgio Agamben).
Por que a poesia/ arte contemporânea parece muitas vezes estar mais próxima dos grafismos deixados há milhares de anos por Cro-Magnons e Neandertais do que dos grandes monumentos da "cultura ocidental" ?
Parece haver um campo de forças entre a nossa sensibilidade e a pré-história da escrita, o instante em que primatas evoluídos começam a ttraçar ou gravar formas abstratas e rítimicas nas pedras e em ossos de ggrandes animais. (Escrita: scribo, scribere: marrcar com estilo - ponteiro ou haste de metal. Daí nosso estilete).
(...)
Viesse
viesse um homem
viesse um homem ao mundo, hoje, com
a barba de luz dos
Patriarcas: ele poderia
se falasse ele deste
tempo, ele
poderia
apenas gaguejar e gaguejar
sempre - , sempre -,
continuamente.
(Pallaksch, Pallaksch)
Paul Celan (tradução Leila Danziger).
O que pensar? por um lado vivenciamos o ffracasso da comunicação humana (da babel bíblica à bárbárie produzida diariamente: terrorismo, grandes muros).
por outro, a impossibilidade de calar o testemunho (até o silêncio é tagarela).
Entre dois extremos, duas coerçõees - uma que obriga à fala; outra que a proíbe - a eclosão de um paroxismo, choque elétrico, a deriva (atopia) do gozo. Têxtase.
Não um acesso ao sentido, mas um acesso de sentido (Jean-Luc Nancy)
Este pode ser o texto da exposição: sua textura.
por um lado, claro, há proliferação de significados.
As escritas tem nome, tem tonalidades, tem (em suma) um ritmo.
Transcrevemos apaixonadamente um ritmo encouraçado pelo segredo das sensações das coisas (Arturo Carrera).
Por outro lado há mutilação, diluição, apagamento: palavra inter-dita. Rastros do insignificante. Insignificante onde atuam as duas possibilidades prevvistas pela gramática, a de negação e a de inclusão; de não-significante e de dentro-do-significante.
De toda a piração (queima) que nos trouxe até aqui, o que se oferenda é a repetição de um gesto, o peso da mão, o trabalho de um músculo no tempo.
Entre estas ou estes artistas há tantos nexos quanto singularidades. Mas, antes que o nosso pungente desejo de decifração nos leve a mentar sedutoras analogias, restitua-se à escrita um corpo erótico: que a esfinge (imagem viva) nos devore.
Não sou eu precisamente aquilo que escapa à minha própria leitura? (Roland Barthes).
Curadoria: Marcelo Reis de Mello
Local: Centro de Artes Uff
Artistas: Amanda Rocha, Ana Hupe, Karla Gravina, Khalil Andreozzi, Leila Danziger, Malu Pessoa Loeb, Nina Papaconstantinou, Rafa Éis, Rosana Ricalde e Vera Bernardes.
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